Felipe Marques e Talita Moreira
O Santander Brasil abriu ontem a temporada de resultados do primeiro trimestre dos bancos brasileiros com uma rara surpresa positiva em dias de retração econômica. O lucro do banco nos três primeiros meses do ano superou expectativas de analistas e sua inadimplência cresceu abaixo do esperado. O fraco desempenho do crédito, porém, e o que isso representa para as receitas futuras da instituição, esfriou em parte o ânimo de analistas.
O banco obteve lucro líquido gerencial que exclui despesas com amortização de ágio -, de R$ 1,660 bilhão. O ganho foi 1,67% maior que o obtido no mesmo período de 2015 e acabou ficando acima do projetado por analistas ouvidos pelo Valor (R$ 1,37 bilhão).
Parte da surpresa positiva deve-se ao fato de o banco ter usado prejuízos fiscais de anos anteriores para reduzir sua alíquota efetiva de imposto de renda e contribuição social para 10,9%.
As provisões para créditos de liquidação duvidosa (PDD) pesaram sobre o resultado, embora tenham crescido menos que o projetado por analistas. O indicador aumentou 14,8% na comparação anual, ficando em R$ 2,424 bilhões no primeiro trimestre deste exercício. Houve, porém, queda de 12,2% em relação ao último trimestre de 2015.
"Estamos em níveis normais de PDD com deterioração controlada daqui para a frente", afirmou Angel Santodomingo, vice-presidente-executivo e diretor financeiro do Santander, em teleconferência com analistas. Ele lembrou que, no quarto trimestre, o banco precisou fazer provisões adicionais para fazer frente à inadimplência potencial de empresas, já que algumas operações grandes registraram alguns dias de atraso no pagamento, mas que parte desse problema foi resolvido logo no começo do ano.
A taxa de inadimplência, que considera créditos com atraso superior a 90 dias, subiu para 3,3% em março. O indicador estava em 3,23% em dezembro e em 3,02% no fim do primeiro trimestre do ano passado. Ao longo dos três últimos meses, houve leve recuo no índice de pessoa física e leve alta no de pessoa jurídica.
Para analistas do Credit Suisse, as condições macroeconômicas ruins podem ofuscar os esforços do banco para diminuir a inadimplência. Em relatório a clientes, eles observaram que, depois de reduzir os índices de calotes em 10 pontos-base no ano passado, o Santander teve aumento de 7 pontos-base no indicador somente no primeiro trimestre. Santodomingo afirmou que o banco deve ver deterioração "limitada e controlada" no índice de inadimplência daqui em diante.
Para analistas do J.P. Morgan, os resultados foram moderadamente positivos, mas chamaram a atenção para o fraco desempenho do crédito. "O portfólio de empréstimos sofreu com a apreciação do real no trimestre e o apetite de crédito ainda limitado", escrevem, em relatório.
A carteira de crédito ampliada do Santander, que inclui avais e fianças, encolheu 5,7% de dezembro para março, quando ficou em R$ 312 bilhões. O recuo foi de 3,8% em relação a março do ano passado. O único segmento em que houve expansão foi o portfólio de pessoas físicas, por conta de operações de consignado e crédito imobiliário. No crédito para empresas, houve queda de 8,6% em um ano.
Sérgio Rial, presidente do banco, afirmou a jornalistas que espera uma demanda "contraída" por crédito no segundo trimestre, com possível melhora a partir de setembro. Sem fazer projeções detalhadas, Santodomingo disse que o Santander deve encerrar 2016 com uma taxa de crescimento do estoque de crédito perto de "um dígito baixo".
Apesar do fraco desempenho do crédito, o Santander mantém a meta de encerrar o ano com crescimento do lucro em moeda local. "Estamos confortáveis com esse comprometimento", afirmou Rial. Esse otimismo, entretanto, não é consenso no mercado. Analistas do UBS preveem queda de 2,6% no lucro do Santander em 2016, de acordo com relatório divulgado ontem. Para eles, a qualidade dos ativos segue como "principal foco" de atenção. O banco suíço manteve recomendação "neutra" para as units (recibos de ações) do Santander. Ontem, os papéis do banco avançaram 2,35% na bolsa brasileira.
O vice-presidente Santodomingo também ressaltou o fato de o aumento dos spreads ter sido capaz de compensar a mudança do mix de crédito do banco para modalidades de menor risco e, portanto, de menor margem. Com isso, a margem financeira bruta da instituição cresceu 6,4% na comparação anual, para R$ 7,6 bilhões. Na comparação com o quarto trimestre, houve avanço de 2,9%.
Rial voltou a afirmar o interesse do banco em participar da disputa pelos ativos de varejo do Citi no Brasil. "Vamos olhar, temos obrigação de olhar. Mas não temos obrigação de fazer [proposta]", disse. De acordo com o executivo, o processo de venda do Citi está "muito, muito no início".
Questionado sobre as expectativas com relação a um eventual governo de Michel Temer, deixou claro que não vê muito a ser feito sem a ajuda do Congresso. "Não podemos nos iludir: reformas, só com concertação política", disse Rial em entrevista a jornalistas. "Conheço o vice-presidente [Michel Temer], respeito sua trajetória e formação, mas acho que sem o Congresso não há transformação."