Sempre que há saídas líquidas da poupança, uma luz amarela se acende para o crédito imobiliário. Ainda que os saques na principal fonte de recursos para o financiamento habitacional ainda não preocupem, o momento traz à tona as memórias do período entre 2016 e 2017, quando as retiradas atingiram um nível que prejudicou a concessão de empréstimos.’
No segundo semestre de 2017, a Caixa, por exemplo, chegou a aumentar de 20% para 50% do valor do imóvel a exigência de entrada mínima. O momento, porém, é completamente diferente, avaliam especialistas ouvidos pelo Valor. Segundo o professor de finanças Ricardo Rocha, do Insper, a poupança tende a se tornar mais atrativa conforme os juros aumentam. “A caderneta muda de rentabilidade de acordo com a elevação da Selic”, pondera.
Se a taxa básica subir acima de 8,5% ao ano, afirma, a poupança se tornaria uma opção atrativa de investimento conservador, acrescenta. Isso porque esse patamar de juros atua como um gatilho para que a caderneta volte à antiga fórmula de rendimento, de 0,5% ao mês mais a variação da taxa referencial (TR).
“Quando a Selic superar 8,5%, a poupança muda a rentabilidade e passa render 6,17% ao ano mais a TR”, explica. “Acho que, até ajustar a regra de transição, a poupança vai ficar mais exposta a captação negativa”, acrescenta. O consenso do mercado, de acordo com o boletim Focus do Banco Central, aponta para uma Selic de 8,50% no fim de 2021 e de 8,75% em 2022.
O professor de Finanças do Insper pondera ainda que a poupança tem isenção de imposto, enquanto fundos DI, um dos mais conservadores do mercado, têm cobrança de IR com alíquota de 20%. “Por isso o número 8,5% para a Selic é interessante. Considerando uma alíquota marginal de 20%, os fundos DI renderiam 6,8% com os juros nesse patamar, e a caderneta, 6,17% mais a TR, ou seja, acima disso vai ter pouco diferença.”
A mediana das estimativas dos agentes de mercado do Focus mostra uma inflação de 4,18% em 2022. Rocha pondera que, com um IPCA menor, a poupança volta a ter um retorno real positivo. Se for considerada a expectativa indicada na pesquisa do BC, a caderneta registraria um retorno real de 2% no próximo ano.
“A gente tem a ideia de que o pior da inflação está ocorrendo agora”, diz a coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV (GVcef), Claudia Yoshinaga. “Com avanço da vacinação e retomada da economia seria possível ver o dólar mais estável e uma eventual redução da pressão inflacionária.”