Depois de quatro meses e nenhum acordo entre os deputados, a Medida Provisória (MP) 992 perde a validade nesta sexta-feira. O texto autorizava o uso de um imóvel já financiado como garantia para um novo empréstimo e ainda fazia mudanças contábeis que liberavam capital dos bancos para empréstimos.
O Banco Central (BC) estimava um potencial de liberação de R$ 60 bilhões com a primeira modalidade e R$ 127 bilhões com a segunda, que já iria ser finalizada no fim deste ano mesmo se a MP fosse aprovada.
A tramitação da proposta enfrentou percalços nos últimos meses. O deputado Glaustin da Fokus (PSC-GO) só foi indicado para a relatoria do projeto em agosto, um mês depois da edição da medida. Já a primeira versão do relatório foi entregue no dia 19 de outubro.
A matéria esteve na pauta da Câmara desde então, mas não conseguiu ser votada porque deputados da oposição e depois da base do governo resolveram obstruir os trabalhos da Casa.
O primeiro grupo reivindicava a votação do projeto que estendeu o auxílio emergencial e o segundo protestava contra o impasse sobre a presidência da Comissão Mista de Orçamento Públicos e Fiscalização (CMO).
— Tivemos reunião com o governo, Banco Central, Ministério da Economia, segmento de empresários, a Frente Agropecuária, ou seja, tentamos fazer um relatório de muita responsabilidade, mas infelizmente as tratativas envolvendo obstruções acabaram não evoluindo, e o Congresso parou _ disse o relator.
Chamado de compartilhamento de alienação fiduciária de bens imóveis, a modalidade permitiu que alguém que tenha financiado um imóvel de R$ 500 mil, por exemplo, e já pagou R$ 400 mil, possa ir ao banco e pegar “de volta” parte desse valor já pago nas mesmas condições do contrato original de financiamento imobiliário.
A premissa é que usando um imóvel como garantia, as condições dos empréstimos serão melhores, com taxas de juros mais baixas, por exemplo.
De acordo com o Banco Central, 90.660 operações foram realizadas, liberando R$ 13,4 milhões até dia 30 de outubro. Todas esses contratos continuarão valendo mesmo com a perda de eficácia da MP.
Crédito para pequenas empresas
A MP também previa a criação do Programa de Capital de Giro para Preservação de Empresas (CGPE) para facilitar a concessão de crédito no país.
No projeto original, o foco era em micro, pequenas e médias empresas, mas o relator decidiu ampliar os beneficiários, atingindo também produtores rurais e MEIs, por exemplo.
O potencial de liberação era de até R$ 127 bilhões de crédito e até o dia 29 de outubro, R$ 10,9 bilhões tinham sido concedidos. Mesmo se fosse aprovada pelo Congresso, o programa terminaria no dia 31 de dezembro deste ano, como disposto na própria MP.
O incentivo para as instituições financeiras concederem crédito nesse programa decorre de mudança em regras contábeis que liberaram capital para os bancos fazerem os empréstimos. Sem a MP, eles não terão mais esse estímulo.
Procurado, o Banco do Brasil destacou que as operações que estariam enquadradas no programa dentro do período de validade da MP continuam valendo.
“O Banco do Brasil reafirma a assistência às micro, pequenas e médias empresas, corroborada pelos desembolsos a esse segmento em programas de crédito emergencial no montante de R$ 14 bilhões, ocorridos até 30 de setembro de 2020. Desse total, R$ 6,3 bilhões têm enquadramento no CGPE”.
Já o Santander disse que ainda não parou de operar, mas deixará caso a proposta não seja aprovada. Na avaliação da instituição, a CGPE ajudou a estimular as concessões para pequenas empresas.
“A descontinuidade do produto não significa que haverá restrição de oferta de crédito, pois os clientes elegíveis continuarão a ter acesso a outras linhas disponíveis, como o Capital de Giro”, disse.
O Itaú Unibanco já suspendeu as contratações das linhas do CGPE por conta do vencimento da Medida Provisória, mas ressaltou que os contratos feitos no período de validade da MP continuarão ativos.
“Para pequenas e médias empresas, o Itaú já repassou mais de R$ 20 bilhões em linhas emergenciais do governo, via Pronampe, custeio de folhas de pagamentos, FGI (Fundo Garantidor para investimentos) e o próprio CGPE, este com o desembolso de aproximadamente R$ 2 bilhões”.
Na avaliação do relator da MP, a perda de validade da medida traz um prejuízo para as pequenas e médias empresas que poderiam se beneficiar da liberação de crédito.
Segundo deputado Glaustin da Fokus, faltou a articulação por parte do governo para destravar as votações:
— Faltou o diálogo de governo com partidos de base, de oposição, faltou isso. Eu fiz vários alertas a isso para o governo, eu tratei disso com o líder (do governo na Câmara) Ricardo Barros (PP-PR) para que chamasse a turma para conversar, fui algumas vezes na oposição conversar, mas acabei não conseguindo porque a briga estava muito na esfera superior.