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15/04/2016

Summit: Crédito restrito é desafio para retomada do setor

Gilberto Duarte de Abreu Filho afirmou que a concessão de crédito com recursos da caderneta de poupança, no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), deve ter um novo ponto de equilíbrio de R$ 50 bilhões.

Lucas Hirata e Cynthia Decloedt

O mercado imobiliário enfrenta um cenário de concessão de crédito mais restrito, cujo volume de financiamentos caminha para um patamar de equilíbrio menor que em anos anteriores. Sem recursos para o financiamento, a demanda para aquisição de unidades residenciais tem recuado, afetada também pela deterioração das condições macroeconômicas e a baixa confiança entre os consumidores. No lado da oferta, as empresas têm ajustado o ritmo de novos empreendimentos e os lançamentos têm ficado cada vez mais escassos.

O presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Gilberto Duarte de Abreu Filho, afirmou que a concessão de crédito com recursos da caderneta de poupança, no Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), deve ter um novo ponto de equilíbrio de R$ 50 bilhões. O valor representa uma queda, frente aos R$ 75,6 bilhões para aquisição e construção  de  imóveis  em  2015, montante que já era 33% inferior ao apurado no ano anterior.

O crédito para o mercado imobiliário pode retomar patamares importantes, ao redor de R$ 70 bilhões a R$ 80 bilhões ao ano, com retração da taxa Selic para 10% a 11%, segundo apresentação de Duarte no Summit Imobiliário 2016. A projeção se baseia, segundo ele, na tese de que, com os juros nesses níveis, a poupança volta a competir com os fundos de tíquetes menores, entre R$ 50 mil a R$ 100 mil, considerando os custos com taxa de administração e imposto sobre o ganho.

“Nesse momento, o fluxo da poupança volta e pode irrigar o mercado imobiliário”, disse o executivo. Duarte considera que com a taxa de 12,3% projetada para o ano que vem, já existe potencial para boa melhora do mercado.

Em parte, a redução no ritmo de concessão de crédito imobiliária já era esperada, uma vez que o pico positivo do mercado imobiliário ocorreu no começo da década e, desde então, o setor tem perdido força. No entanto, a queda foi reforçada nos últimos anos com os contínuos saques líquidos da caderneta de poupança, que é a principal fonte de recursos para oferta de crédito imobiliário. Por causa da deterioração da economia e alta dos juros, os contribuintes passaram a tirar dinheiro das contas para pagar obrigações ou  investir em  ferramentas mais rentáveis.

O saldo da poupança somou em fevereiro R$ 499,3 bilhões, com retração de 3,7% na comparação com igual mês do ano passado. Atualmente, o mercado de crédito concedido para habitação ultrapassa R$ 1 trilhão, considerando os cerca de R$ 499 bilhões de SBPE, R$ 340 bilhões com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviços (FGTS), R$ 193 bilhões em Letra de Crédito Imobiliário e R$ 61 bilhões em Certificados de Recebíveis Imobiliários.

Apesar do cenário atual adverso, o diretor presidente da Lopes Consultoria de Imóveis, Marcos Lopes, presente ao evento, continua otimista. “Como todo corretor, tenho de ser otimista, mas sem perder o realismo.” Segundo ele, se comparado com outros países, o Brasil ainda tem muito a crescer com relação ao crédito imobiliário.

Juros e fundos imobiliários - Apesar da perspectiva cautelosa para concessão de crédito, o mercado já trabalha com o início da trajetória de corte de juros, o que deve beneficiar o rendimento de fundos imobiliários. Para o diretor da área de fundos imobiliários do Credit Suisse, Hedging-Griffo, André Freitas, a correção negativa entre juros do mercado e preços de fundos parece estar sendo retomada. Em apresentação feita no Summit Imobiliário, o executivo disse que agora é o mo- mento de entrarem fundos imobiliários, que podem encerrar o ano de 2016 entre as maiores valorizações do mercado.

Esses fundos tiveram queda de 12,7% em 2013 e baixa de 2,8% em 2014. Já no ano passa- do, a alta foi de 5,5%. As variações foram atenuadas pelos dividendos, de acordo com o executivo. Ao descontar os dividendos, a variação das cotas foi bem maior do que se pensava inicialmente, com queda de 16% em 2013, baixa de 28,45 em 2014 e recuo de 2,3% em 2015. Já nos três primeiros meses de 2016, observa-se uma alta de 5,1% nos fundos e elevação de 3,8% se excluídos os dividendos.

André Freitas explicou que a economia nacional está se direcionando para uma trajetória de queda da taxa básica de juros, a Selic, tendo em vista projeções de grandes bancos e do Boletim  Focus. O  executivo também apontou que a diferença entre o valor de mercado e o valor patrimonial dos fundos está recuando. Essa diferença, que já chegou a cerca de 35%, encontra-se hoje em 27%, a menor desde julho de 2015. “Hoje há uma mudança em andamento”, afirmou. “Estamos no momento de virada dos fundos imobiliários”, ressaltou o executivo.

Segmento de baixa renda - Os juros também foram alvo de discussão para o segmento de baixa renda do mercado imobiliário e para o programa Minha Casa Minha Vida (MCMV). Para o sócio diretor da construtora e incorporadora Plano&Plano, Rodrigo Luna, o teto de juros para aquisição de imóveis dentro do Minha Casa deveria ser de no máximo 5% ao ano. O executivo considera que o programa teria de ser enquadrado à capacidade de pagamento de par- celas das famílias. Por isso, o aumento de juros, como ocorrido na nova fase do MCMV, pode diminuir a demanda e o ritmo de construção. Os recursos para o crédito do Minha Casa vêm do FGTS, diferentemente de segmentos de média e alta rendas, cujo funding vem da poupança. 

“Como a remuneração do FGTS, que é a principal fonte de recursos para financiamentos no programa, é fixa em 3% mais TR, não tem motivo para aumento de juros para o tomador de crédito”, afirmou o executivo, que também ocupa a cadeira de vice-presidente de habitação econômica no Secovi-SP. “Isso só dificulta o acesso ao crédito e o programa vai ter muito menos contratações.”

Apesar das críticas ao modelo atual, o executivo defendeu que o programa seja mantido independentemente do governo. “Se as pessoas tiverem o mínimo de bom senso e de preocupação com o Brasil, tratarão o programa como política habitacional de Estado e não de governo. E acrescentou: “O déficit habitacional só se resolve com política habitacional séria, perene e de longo prazo".

FONTE: O ESTADO DE S.PAULO - ESPECIAL SUMMIT