O mercado de terrenos para empreendimentos de média e alta renda está bastante aquecido, na cidade de São Paulo, como reflexo da retomada dos lançamentos e dos recursos que estão chegando ao setor nesta nova leva de ofertas iniciais de ações (IPOs). O reaquecimento das negociações da principal matéria-prima para a produção de imóveis começou em junho e ganhou força a partir de julho. Os preços estão elevados e, em casos pontuais, a disputa por áreas chega a ser quase um leilão.
“Desde o início do ano, os preços de terrenos para empreendimentos de média e alta renda aumentaram de 20% a 30%, como reflexo da procura”, conta Ronny Lopes, sócio da Arquimóvel, empresa que representa incorporadoras na compra de áreas.
Há demanda, principalmente, por terrenos localizados nos chamados eixos estruturantes - proximidades de estações de metrô e de corredores de ônibus -, regiões cujo potencial construtivo cresceu com o novo Plano Diretor. Recentemente, Abrão Muszkat, fundador e presidente da You, incorporadora com foco em projetos para a classe média desenvolvidos nos eixos, disse ao Valor que “a compra de terrenos está muito difícil”.
“O mercado de terrenos está extremamente concorrido. Temos visto a volta dos fundos, e a busca de capitalização de incorporadoras pelos IPOs”, diz o diretor comercial e de marketing da Trisul, Sérgio Marão, acrescentando que o novo Plano Diretor limitou a verticalização da cidade de São Paulo.
No chamado remanso (miolo de bairros), o setor considera difícil a viabilidade de empreendimentos devido ao potencial construtivo menor do que o dos eixos.
Segundo o diretor financeiro e de relações com investidores da Mitre Realty, Rodrigo Cagali, o mercado continua muito aquecido nas regiões mais nobres de capital paulista. “Basta andar por São Paulo para ver a quantidade de tapumes nos terrenos”, diz Cagali. Desde seu IPO, em fevereiro, a Mitre lançou R$ 450 milhões e comprou áreas correspondentes ao VGV de quase R$ 1 bilhão. “O banco de terrenos de R$ 4,8 bilhões nos dá bons anos de lançamentos”, afirma o diretor da Mitre.
O setor imobiliário começou 2020 com otimismo e expectativa de crescimento expressivo do Valor Geral de Vendas (VGV) a ser lançado. Com a pandemia de covid-19 e o fechamento temporário dos estandes de vendas, incorporadoras adotaram postura cautelosa em relação a lançamentos e, consequentemente, nas negociações de terrenos. Com a volta gradual da apresentação de projetos, as negociações de áreas ganharam força outra vez.
Segundo Lopes, da Arquimóvel, recentemente, um proprietário de terreno no bairro nobre de Moema, na zona Sul da capital paulista, recebeu seis propostas pela área. “Leilões de terrenos ocorrem quando o proprietário é do mercado ou conhecedor do mercado”, diz o sócio da Arquimóvel. Ele acrescenta que nem sempre “a conta fecha” para as empresas diante dos atuais preços pedidos pelos proprietários de terrenos.
Pablo Meira Queiroz, do escritório Tozzini Freire Advogados, avalia que as negociações estão complexas, com busca de equilíbrio entre o que os donos de terrenos acham que o ativo vale e o quanto as incorporadoras consideram que é o valor real. Há uma tentativa por parte das empresas, de acordo com Queiroz, de não repetir os erros “do primeiro ‘boom’ de acesso ao mercado de capitais”.
Na avaliação de Cyro Naufel, diretor técnico da rede de imobiliárias Lopes, incorporadoras devem ter cuidado quando o preço da área não é compatível com o valor pelo qual os apartamentos são vendidos atualmente. “A pandemia segurou a recuperação de preços dos imóveis. Em 2021, a alta será inevitável, como consequência dos aumentos de preços de terrenos e de insumos”, afirma o executivo da Lopes.
No segmento econômico, também há forte aquecimento nas negociações. Diante da grande concorrência, há proprietários de terrenos fazendo leilão das áreas, segundo a diretora de incorporação da Kazzas, Gil Vasconcelos. “Um terrenista nos mostrou planilha com o preço que cada concorrente estava disposto a pagar”, conta. Vence a disputa, segundo Gil, a incorporadora que consegue desembolsar fatia maior em dinheiro.
A Kazzas, que faz parte do grupo Kallas, vai lançar R$ 1 bilhão, neste ano, e já possui R$ 1,7 bilhão para os projetos a serem apresentados em 2021. “Já estamos começando a pensar no banco de terrenos para 2022”, afirma a executiva. Dos lançamentos da Kazzas, 90% se enquadram no programa habitacional, com unidades até R$ 240 mil, e 10% são apartamentos com valor entre esse teto e R$ 300 mil.