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20/12/2018

Votorantim elege energia e imóveis para o novo ciclo

No decorrer deste ano, a Votorantim saiu de dois importantes negócios no país - fabricação de celulose, com a venda de Fibria, uma empresa líder mundial, e de aços longos

No ano em que chegou ao centenário de fundação, o grupo Votorantim completou alguns movimentos e deu partida a um novo ciclo de investimento. Parte disso está relacionada a uma estratégia mais associativa, que já vem desde 2009, e outra parcela se definiu com o plano de passar a atuar cada vez mais como gestora de ativos. "O grupo, desde 2016, reestruturou-se no modelo de gestão de portfólio de ativos. Uma mudança significativa", disse ao Valor o presidente da Votorantim S.A., João Miranda. Ele está há mais de uma década no quadro de executivos do grupo, tendo assumido a VSA após a sua reorganização, englobando todos os negócios e ativos.

No decorrer deste ano, a Votorantim saiu de dois importantes negócios no país - fabricação de celulose, com a venda de Fibria, uma empresa líder mundial, e de aços longos. Mas, ao mesmo tempo, o grupo lançou as fichas para se posicionar como importante investidora em duas áreas. O foco são negócios menos expostos à volatilidade econômica global e dos mercados, como commodities.

A saída desses negócios não deverá afetar o tamanho do grupo, um dos maiores do país. Com a melhoria de preços de alguns dos produtos que faz, como alumínio e zinco, e também de cimento, a expectativa é de que vire 2018 com uma receita líquida na casa de R$ 32 bilhões, um aumento de quase 20% sobre o ano passado. Estimativas apontam que o lucro líquido, puxado por resultados que virão do quarto trimestre, possa até superar R$ 1,1 bilhão, também acima de 2017.

Nos novos passos definidos para 2019 em diante, a companhia, diz seu time de comando, entrará com muita disposição, em geração de energia renovável: hidrelétricas, PCHs, eólica e solar. Será um "business de peso" na grade de atividades do grupo em alguns anos, garante Miranda. Começa o ano projetando receita na casa dos R$ 2,5 bilhões.

Outra frente de investimento é a construção imobiliária. De um lado, desenvolvendo projetos; de outro, o mercado de renda estável, com a aquisição de edifícios comerciais prontos para locação.

A primeira das frentes, energia, já é uma velha conhecida da Votorantim, quando, em meados da década de 50 do século passado, a família, sob o comando de José Ermírio de Moraes, avaliou como fundamental, para dar conforto aos seus negócios, a garantia de suprimento energético. O movimento de agora tem nova configuração - a empresa estará presente como grande investidor e voltada ao mercado de energia.

A área imobiliária é estreia. Vai aproveitar-se de vastos terrenos que possui bem localizados e espalhados no país, em cidade como São Paulo, para desenvolver empreendimentos residenciais e comerciais, todos em parceria com grupos atuantes do setor. Além disso, quer também investimento com retorno definido por meio de renda de aluguel. Neste caso, está pronta para ir ao mercado já e fazer aquisições de edifícios comerciais para locações. O objetivo é ter renda garantida por longo prazo.

Outros investimentos deverão surgir pelo caminho nos próximos anos, e não estão descartadas oportunidades em setores que vão desde tecnologia, os chamados negócios leves, sem necessidade de capital intensivo, serviços e indústria de bens de consumo, até a área de infraestrutura (ativos que serão ofertados em regime de concessões).

Miranda e seu time - que tem os escudeiros João Schmidt, diretor de desenvolvimento corporativo, e Sérgio Malacrida, diretor de finanças - estão trabalhando sem pressão, mapeando novas oportunidades. Não faltam bancos de investimento batendo à sua porta, na sede da Votorantim, com as mais diversas propostas para adquirir ativos, principalmente depois de consolidar a bilionária venda da Fibria para o grupo Suzano. Entre dinheiro (mais de 80%) e ações da nova empresa são cerca de R$ 11 bilhões.

O executivo não ficou esperando o caixa ser recheado com o dinheiro da Fibria para fazer um primeiro movimento. Desde julho, sua equipe trabalhava na surdina, avaliando a estatal de energia paulista Cesp, que não conseguiu ser vendida durante 20 anos em várias tentativas. Foi só o governo paulista definir a data do leilão e lá estava, pronta, a Votorantim e seu sócio, o fundo canadense CPPIB. Juntos, arremataram o controle da hidrelétrica por R$ 1,7 bilhão.

"Com o investimento que iniciamos em eólica dois anos atrás, demos a partida para esse negócio. A aquisição da Cesp possibilita acelerar nossos planos de construir uma plataforma robusta em energia", disse Miranda. Ele acrescenta: "já temos a segunda maior comercializadora de energia do país e, agora, uma das mais importantes geradoras". Em geração, após a incorporação de Cesp, o grupo ficou com capacidade instalada de 2,1 gigawatts.

O executivo ressalta que o desembolso de R$ 850 milhões da Votorantim na Cesp não afeta em nada a meta de alavancagem financeira da companhia no fim de 2018, que deve encerrar bem confortável - com relação de duas vezes da divida líquida sobre Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). No fechamento do ano, o endividamento líquido do grupo deve ficar na casa de R$ 13 bilhões, com um Ebitda de R$ 6,5 bilhões.

Em 14 de janeiro, a companhia receberá o dinheiro da Suzano - mais de R$ 7 bilhões, considerando que já teve adiantamento de R$ 800 milhões na forma de dividendos pagos pela Fibria. E, de sobra, ficará ainda com 5,6 % do capital da nova Suzano. É hora de sair correndo às compras? Miranda balança a cabeça para os lados e diz que os Ermírio de Moraes têm muito bem os pés no chão na hora de tomar decisões.

Em breve, será anunciada uma nova empresa, resultado dos investimentos realizados em eólica no Piauí, que já está gerando energia desde fim de 2017, e da compra da Cesp. Será essa empresa que irá fazer frente às novas oportunidades - e elas não faltarão, com privatizações prometidas pelo novo governo e com o mercado secundário, observa Miranda. Além de médias e grande geradoras, parques eólicos e projetos de energia solar, vão ser avaliadas pequenas usinas, as PCHs. "A tudo que for energia renovável estaremos atentos", diz Schmidt.

Uma abertura de capital da nova empresa, que começa 2019 com receita estimada em R$ 2,5 bilhões, não está descartada no futuro. "É uma opção que teremos, não existe necessidade. O CPPIB está feliz, tem fôlego financeiro e desejo por novos investimentos. Nós também estamos preparados. Há muito gás para crescer assim. Não há pressa", diz.

A atual Votorantim Energia vai atuar em duas frentes: como comercializadora e gestora de hidrelétricas de outras empresas do grupo e como dona de 50% da joint venture com os canadenses.

Na área de construção, o plano é deslanchar os investimentos logo. No segmento de aluguel, a empresa já tem alvos prontos para adquirir, fazendo uma trajetória parecida à dos fundos de pensão, com imóveis prontos. "Os investimentos imobiliários entram na categoria de ativos que servem para renda e que ajudam a ter um fluxo de caixa mais estável", afirma Miranda. Energia também está aí, com contratos de venda por período de 20 anos.

O primeiro projeto de incorporação imobiliária em destaque é o que está previsto para ser montado em um terreno na Vila Leopoldina, em São Paulo, ao lado da Marginal Pinheiros, onde funcionou a Metalúrgica Atlas. São 120 mil metros quadrados de área. "É um projeto de intervenção urbana, que vem sendo discutido há dois anos e meio com o governo municipal", diz o executivo.

O empreendimento tem uma contrapartida social da ordem de R$ 100 milhões para moradores no entorno, envolvendo postos de saúde, escolas e infraestrutura urbana. No local já existem dois galpões - um de eventos e outro de coworking. A obra está desenhada para combinar moradias, escritórios e até um hotel. Não se fala ainda em montante a ser desembolsado para viabilizá-lo.

Há projetos também previstos para áreas da Votorantim vários lugares, como Sorocaba (SP) e Pernambuco. O banco de terrenos é enorme. Estudou-se a vocação de mais de 400 imóveis. Para cada um estão sendo analisadas: de plano urbanístico, em alguns casos, à venda em outros.

Os negócios consolidados, conta Miranda, seguem seu ritmo conforme planos traçados. Caso de alumínio e polimetálicos (zinco, cobre e chumbo), que estão com suas operações ajustadas e planos - de expansão ou de gestão - bem encaminhados.

Já as duas empresas de aços longos, na Argentina e Colômbia, poderão, em algum momento, oportuno e com ofertas atrativas, ter o mesmo destino dos ativos de siderurgia do Brasil, que passaram ao controle da ArcelorMittal. A VSA ficou dona de uma parcela minoritária. Todavia, nos dois países, a decisão deverá ser pela venda total.

Uma atenção especial deve ser dedicada à Votorantim Cimentos, que responde por mais de 40% da receita do grupo e que, neste ano, voltou a ter recuperação nos resultados. O grupo já anunciou novo presidente para a companhia - Marcelo Castelli, que deixa a Fibria e m 14 de janeiro e assume a cimenteira em 1º de fevereiro no lugar de Walter Dissinger. A controladora deverá fazer um ajuste de foco de negócios da VC, ao mesmo tempo em que vai avaliar sua estrutura de capital para reduzir o peso da dívida e começar a preparar a empresa para uma abertura de capital em alguns anos. Vai esperar o mercado de cimento, principalmente no Brasil, voltar a crescer, depois de quatro anos de depressão, no período de 2015 a 2018.

FONTE: VALOR ECONôMICO