A Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) foi constituída no I Encontro Nacional das Empresas de Crédito Imobiliário e Poupança, realizado no Club Nacional, em São Paulo, de 17 a 19 de agosto de 1967, ao qual compareceram representantes de 34 companhias. A criação da entidade foi o ponto alto do encontro, ao qual compareceram pioneiros do financiamento imobiliário no Brasil, sócios e diretores das Sociedades de Crédito Imobiliário (SCIs) e das Associações de Poupança e Empréstimo (APEs), advogados, incorporadores e corretores de imóveis.
Três anos antes, havia sido implantado um modelo habitacional de grande amplitude, nunca antes visto na história do Brasil – o Sistema Financeiro da Habitação (SFH). A história do SFH e a história da Abecip mostraram caminhos comuns. Antes do SFH, o financiamento da casa própria dependia de escassos recursos orçamentários e era privilégio de poucos. Até 1964, não havia correção monetária, nem juros reais – previstos no modelo inovador – e, portanto, não havia retorno para o capital empregado.
A Abecip nasceu como sociedade civil de direito privado, sem fins lucrativos, representante do setor financeiro de crédito imobiliário, congregando as instituições integrantes do SFH, do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) e, a partir de 1997, também do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI). Essa posição permitiu-lhe exercer suas atividades, em escala nacional, de forma abrangente e com eficiência. A entidade foi formada para participar da política habitacional que nascia e responder ao desafio de atender à demanda de habitações das classes médias emergentes e da população de baixa renda. Havia, então, um enorme mercado inexplorado – e a entidade queria estar presente no seu desenvolvimento.
O propósito dos fundadores, seguido até hoje por seus sucessores, foi desempenhar um papel decisivo na estruturação do crédito imobiliário do País – como ocorre nas mais de quatro décadas da vida da entidade. São ambiciosos os objetivos da associação: oferecer contribuição para moldar a arquitetura institucional do crédito imobiliário, cumprindo papel protagonista no processo.
A empreitada foi bem sucedida. O papel da entidade foi decisivo na organização dos empresários privados do crédito imobiliário e na discussão tanto da pauta como das regras necessárias ao bom funcionamento de um sistema abrangente.
Em toda a história do SFH, a entidade desempenhou papel decisivo como elo de ligação entre os empresários privados e o governo. Isto foi essencial, por exemplo, na fase de implantação do SFH, um modelo complexo, concebido, em 1964, pelos ministros Roberto de Oliveira Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, no primeiro ano do governo Castello Branco (1964-1967). O SFH foi o campo de provas da correção monetária, sem a qual seria impossível a convivência de um sistema de crédito de longo prazo com a inflação. Esta, a anomalia maior da economia brasileira, que só viria a ser derrotada três décadas depois, em 1994, com o Plano Real.
Nos seus primórdios, o SFH foi concebido com pilares sólidos. Baseava-se numa instituição de segunda linha, com poderes normativos, o Banco Nacional da Habitação (BNH). Operava por intermédio das cooperativas habitacionais (Cohab’s), caixas econômicas, APEs e SCIs (só a partir dos anos 80 os bancos comerciais passaram a atuar no setor). E dispunha de mecanismos para evitar desequilíbrios temporários na vida econômica dos mutuários, como o Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS).
Até meados dos anos 70, enquanto a inflação era moderada para os padrões da época, o SFH foi bem sucedido. O sistema se baseou numa forte estrutura de captação de recursos, no BNH, nas caixas, SCIs e APEs, baseada nas letras imobiliárias e nas cadernetas de poupança – que fizeram enorme sucesso desde seu lançamento e de uma maciça campanha institucional. Ao mesmo tempo, foi mobilizada para o desenvolvimento do SFH a poupança forçada dos trabalhadores no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Viabilizou-se a implantação de um sistema habitacional de grande espectro, que até o final dos anos já havia assegurado o financiamento de 2,5 milhões de moradias – hoje, esse número alcança 8 milhões.
Mas com a volta da inflação elevada, em meados daquela década, o SFH passou a enfrentar problemas. Faltaram os elementos básicos da prosperidade de um modelo de longo prazo: crescimento econômico, emprego formal, mobilidade social.
Nos anos 80, com a exaustão do sistema por uma política errática de subsídios a quem deles não precisavam, impôs-se a reforma do modelo habitacional – e a Abecip, uma vez mais, teve papel fundamental na transformação.
A combinação de pressões políticas com populismo econômico abalou o modelo do crédito habitacional. Para não admitir suas próprias limitações, o governo fechou o BNH, em 1986, transferindo ao Banco Central a responsabilidade pela regulação do setor de crédito imobiliário.
Mas isto não bastava. Era preciso reformar o sistema, primeiro, para separar o segmento de mercado, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que opera com recursos das cadernetas de poupança, do sistema social, que depende de subsídios e de recursos orçamentários e do FGTS.
Para fortalecer o aparato regulatório, conferir segurança às operações de crédito e incrementar o mercado secundário de ativos imobiliários, a Abecip promoveu centenas de reuniões, seminários, workshops, congressos nacionais e internacionais para buscar na experiência internacional as melhores soluções para aprimorar o modelo doméstico. Viveu-se, entre o final dos anos 80 e meados dos 90, uma década de debates, em que despontou a contribuição de notáveis especialistas, como o ex-ministro Mário Henrique Simonsen e o ex-presidente do Banco Central, Gustavo Loyola. Como resultado, nasceu, em 1997, o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI). Aprovado no Congresso Nacional sob a forma da Lei 9.514, complementada, mais tarde, pela Lei 10.931, o SFI trouxe no seu bojo a securitização dos recebíveis imobiliários, o mecanismo da alienação fiduciária de bens imóveis, seguidos da criação do patrimônio de afetação.